Lavagem
marca um ano do Cais do Valongo como Patrimônio da Humanidade
Publicado
em 09/07/2018 - 20:24
Por Akemi
Nitahara – Repórter da Agência Brasil Rio de Janeiro
Para celebrar o primeiro
aniversário do título de Patrimônio Cultural da Humanidade concedido ao
Cais do Valongo pelo Comitê do Patrimônio Mundial, ligado à Organização das
Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (Unesco), uma lavagem simbólica
com água de cheiro foi feita hoje (9) no local por ativistas do
movimento negro e seguidores de religiões de matriz africana, ao som dos
atabaques e xequerês do Afoxé Filhos de Gandhi.
O Brasil recebeu cerca de 4
milhões de escravos nos mais de três séculos de duração do regime escravagista,
o que equivale a 40% de todos os africanos que chegaram vivos nas Américas,
entre os séculos 16 e 19. Desses, aproximadamente 60% entraram pelo Rio de
Janeiro, sendo que cerca de 1 milhão deles pelo cais.
A ialorixá Edelzuita de Oxalá,
representante do Instituto Nacional e Órgão Supremo Sacerdotal da Tradição e
Cultura Afrobrasileira, destaca que o ritual da água simboliza a purificação
das, como chamou, primeiras religiões do mundo. “Orixá é natureza, a
natureza já estava aí antes de qualquer coisa. Representam os quatro elementos
básicos: a terra, a água, o ar e o fogo. A lavagem é uma purificação dos
afrodescendentes que ainda estão nesse país. É importante para o cais não cair
no anonimato e preservar a memória do povo negro”.
A secretária municipal de Cultura
do Rio de Janeiro, Nilcemar Nogueira, destaca que a prefeitura tem
trabalhado para valorizar todas as tradições culturais da cidade, independentemente
da matriz de origem. “A cidade deve celebrar todos os seus marcos históricos,
toda a sua história, principalmente as histórias desconhecidas da população. A
ancestralidade do povo negro, a formação da cultura brasileira tem que ser
conhecida. A matriz africana é a que precisa ser fortemente trabalhada, uma vez
que ela é desconhecida, principalmente por estar fora da historiografia
oficial”.
Lavagem do Cais do Valongo, por religiosos de matriz africana, marca um
ano da concessão do título de Patrimônio Mundial Cultural da Unesco ao sítio
arqueológico - Tomaz Silva/Agência Brasil
Troca do dia
O antropólogo Milton Guran, que coordenou o grupo
de trabalho que elaborou o dossiê de candidatura do Valongo como patrimônio
mundial, explica que a lei municipal que instituiu a lavagem determina que a
cerimônia seja feita no primeiro sábado de julho, mas que a
transferência para um dia de semana esvaziou o ato, que costuma reunir centenas
de pessoas em uma festa popular que dura cerca de 5 horas.
“A lavagem do cais é esse momento ecumênico em que
todos se reúnem para reverenciar a memória dos que aqui pereceram e se unir em
uma prece para que todos possam se integrar e que daqui para frente a vida seja
melhor para todos. Foi esse o espírito da lei. Mas estamos assistindo nessa
administração municipal o esvaziamento persistente de tudo o
que diz respeito à matriz africana na cidade. Assim, a cerimônia foi
transferida para uma segunda-feira de manhã, quando todo mundo está
trabalhando”.
Segundo a secretária de Cultura,
a transferência do dia este ano foi feita a pedido da ialorixá Edelzuita de
Oxalá, responsável pela cerimônia, para coincidir com a data do registro como
Patrimônio Cultural da Humanidade. Mãe Edelzuita confirma que pediu para
transferir o dia e informa que no sábado (14) haverá uma missa campal
no Cais do Valongo em homenagem aos ancestrais.
Museu
Após a lavagem, os ativistas
fizeram um ato no Centro Cultural da Organização Não Governamental Ação da
Cidadania, que fica em frente ao Cais do Valongo, para reforçar o pedido
de que o local abrigue um museu de memória do povo negro.
E organizações da sociedade civil
argumentam que o complexo está abandonado e corre risco de perder o título concedido
pela Unesco.
Saiba mais
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Edição: Carolina
Pimentel
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